quarta-feira, 5 de junho de 2013

Adotar é amar

      Em várias partes do mundo foram muitas as comemorações alusivas ao Dia Internacional da Mulher. Desde alguns cumprimentos, até a entrega de flores ou convites para jantar. Cuida-se de exercitar a criatividade, pois há muitas formas de se comemorar essa data. Acredito até que já escrevi algo a respeito e lembro que nalgum momento afirmei que “é muito pouco”, pois, para mim, celebrar a existência das mulheres é imperativo. É assim como celebrar a própria vida.
      Mas, dentre tantas formas de se comemorar essa data, uma delas chamou-me à razão: o Tribunal de Justiça da Paraíba – TJPB, talvez até pelo fato de estar sendo presidido por uma mulher (a Desembargadora Fátima Cavalcanti), coordenou as comemorações daquele dia, em diferentes datas e em diferentes comarcas, dando ênfase ao sentimento que para mim é o mais sagrado: a maternidade. E fê-lo dando mais ênfase à maternidade que se materializa através da adoção. A ideia não poderia ter sido melhor.
      Comecei a pensar bastante naquele tema e lembrei das milhares de crianças em todo o mundo que são abandonadas e mau tratadas (como se o abandono já não fosse, por si, um grande mau trato).
      Não tenho o direito, num primeiro instante, de culpar os pais que abandonam ou maltratam os seus filhos, assim como não quero justificar-lhes tais atos. Mas quantos noutras épocas também foram vítimas de abandonos e maus tratos?
     Penso como deve ter sido angustiante, especialmente para uma mãe, num imaginário momento de lucidez, ter que largar uma criança nalguma sarjeta ou calçada, ou numa aleatória porta. Prefiro pensar assim pois não consigo imaginar uma mãe que não sinta a dor de uma separação, mesmo nessas circunstâncias. E só conhece a intensidade dessa dor quem já passou por ela.
     Algumas dessas crianças, muitas delas recém-nascidas (parece até que existe um parâmetro para o abandono), ao serem abandonadas são acolhidas em abrigos para menores. Ali estão em seu lar, mas sempre à espera de alguém que venha a adotá-las.
      Desde que ali chegam recebem a atenção das pessoas que lá trabalham, voluntárias e funcionárias. Ali convivem com outras crianças de várias idades: desde igualmente recém-nascidas até algumas cujas idades chegam aos sete anos. É que nestes abrigos as crianças não podem ficar além dessa idade.
     Como é triste saber que a expectativa pela adoção é muitas vezes frustrada e que esta frustração cresce à medida que o tempo se esvai e que se aproxima aquela “idade-limite”, sendo ainda mais triste imaginar que uma criança já carrega consigo esta expectativa.
     Apesar de viverem nos abrigos, cercados de todo o carinho e de toda atenção que podem ter, são crianças ansiosas e angustiadas. Deve-se imaginar como deve ser difícil a vida de adultos com ansiedades e angústias. Com dúvidas e incertezas. O que dizer, então, de crianças cercadas por estes sentimentos?
     São crianças de quem se tirou a infância tanto quanto são crianças tiradas da infância. Ainda são crianças mas já amadureceram o suficiente para se sentirem como se tivessem saído das páginas de “Os Miseráveis”, de Victor Hugo. Quantas Cosettes existem ao redor do mundo? Todas com aquele olhar angustiado.
       É triste pensar que, naquelas tenras idades, muitas já terão mais passado que futuro.
       Estas angústias e ansiedades aumentam quando se tem outra consciência: a partir dos sete anos aquelas crianças serão transferidas para outros abrigos, onde encontrarão outras com idades que vão dos sete aos catorze anos. Não há que se negar: os riscos são iminentes. Ali, não obstante a atenção das pessoas que delas cuidam, todas essas crianças virarão alvos de cobiças das crianças maiores. Essas cobiças têm diversos matizes, como ameaças, agressões físicas e submissão à perversões sexuais. Só para citar alguns.
    Para essas crianças, passada a fronteira da “idade-limite”, as expectativas são irremediavelmente sombrias. Mas há uma forma de lhes poupar desse amargo destino: a adoção.
      Colha-se, aqui, o que afirma Maria Berenice Dias (Manual de Direito das Famílias, 7ª Edição, RT, 2010) : “Qualquer pessoa pode adotar. Pessoas sozinhas: solteiras, divorciadas, viúvas. A lei não faz qualquer restrição quanto à orientação sexual do adotante. Nem poderia fazê-lo. Quem é casado ou vive em união estável também pode adotar”.
       É claro que a lei estabelece alguns parâmetros como a idade mínima do adotante (18 anos) e a diferença mínima de idade entre adotante e adotado (16 anos), mas esses aspectos serão prontamente esclarecidos por advogados que militam no Direito das Famílias ou nas Varas de Infância e Juventude das comarcas.
       O que deve ficar patente nesta hora é que adotar não é apenas um ato jurídico ou social. Adotar é essencialmente um ato de amor.

Perácio Bezerra

terça-feira, 21 de maio de 2013

Mulheres-Mães

        Ao iniciar a série de artigos que me propus a escrever neste blog, revisitei alguns trabalhos antigos e, mutatis mutandis, substituí algumas palavras por considerá-las em desuso para o momento. Aproveitei, também, a ocasião em que se homenageiam as mulheres em seu dia das mães, para brindá-las, assim como aos demais leitores, com o texto abaixo, publicado originalmente no Jornal da Paraíba, em sua edição de 14.05.2000.

Mulheres-Mães
Perácio Bezerra

       Há, na cultura judaica, a consciência de que Deus conta as lágrimas das mulheres.
       Verdade inconteste, na realidade não há na vasta obra da criação divina um ser mais puro, mais sublime e mais bonito do que a mulher, e, para que se perceba isto, não é preciso que o seu rosto esteja ungido em lágrimas.
       Essas lágrimas que a emolduram, emoldurando assim a sua beleza, podem ser de tristeza, de angústia, de solidão, de inquietação, de ansiedade, de alegria, de paz, de espera e de amor. Nunca de ódio.
       A história tem se encarregado de dedicar a essas mulheres uma face particularmente triste e desigual do seu longo e interminável curso. Mire-se nos exemplos do que ocorre em determinadas culturas, em que às mulheres não é permitido, sequer, mostrar o rosto, ou em outras culturas em que se lhes mutila a genitália para que assim não tenham prazer sexual, ficando relegadas à função meramente reprodutora, ou ainda, na nossa própria cultura, em que às mulheres não era dado, há até bem pouco tempo, o direito de votar.
       Mas não é só isso. Há toda uma série incontestável de discriminações, que passam pela violência sexual em suas diversas formas, agressões físicas as mais grotescas e, a pior de todas elas, a agressão psicológica, que anula qualquer valor que uma mulher possa ter, e que são muitos.
       Há um tipo de agressão particularmente deplorável, aquela que se pratica entre quatro paredes, sendo muito comum aquelas de natureza sexual praticadas pelos cônjuges ou companheiros que, muitas vezes, sem respeitar aspectos íntimos da mulher, forçam-nas a ter relações íntimas em ocasiões em que as mesmas, até por problemas hormonais, não estão acessíveis ou receptivas, transformando aquilo que poderia ser mágico e bonito num ato repugnante e animalesco.
       Mas há, também, a parte agradável desta mesma história. É que não fossem tantos predicados e eis que a essa maravilhosa criação divina ainda foi concedido o privilégio da maternidade, sendo-lhe dado conceber, gerar, parir, amamentar (fenômeno particularmente belo) e educar um filho para, finalmente, com amor e a resignação somente próprios às mulheres, vê-lo partir, pois que o criou para o mundo.
    Mais uma vez estamos diante de uma atribuição fantástica: ser mãe. E não somente aquelas mães biológicas, mas as adotivas, as estéreis, as mutiladas, enfim, pois todas elas, indistintamente, nasceram com a intuição e o instinto maternal, fato que se observa até mesmo na infância, pois parece até que há um aprendizado natural, como se já existisse, na cabeça de cada menina, a pergunta: como é que se aprende a ser mãe?
      A propósito, nos ensina o ilustre professor Angelo Gaiarsa: “Como é que se aprende a ser mãe? Em primeiro lugar, convencendo-se de que nunca foi e de que pouco sabe a respeito. Dispondo-se, isto sim, a aprender a ser mãe – ao contrário de tudo o que lhe foi dito até o momento. Uma mãe aprende a ser mãe principalmente através do contato físico com a criança, nas horas de tê-la no colo, de tê-la junto, de banhá-la, de limpá-la, de alimentá-la. Mas, sobretudo, quando a tem nos braços ou junto de si. É aí, é então e é assim que mil gestos, mil modos de pegar, mil movimentos da criança, mil olhares soltos começam a tecer a trama sutil que une essas duas criaturas que viveram em simbiose durante nove meses. Essa simbiose continuará durante um certo tempo. Um tempo muito menor do que nós acreditamos, mas um tempo ainda bastante dilatado.”
      O privilégio da maternidade em todos os seus aspectos, é, pois, o que torna as mulheres diferentes e especiais, além de particularmente belas. 
      Temos, pois, o dever de preservá-las, respeitá-las, amá-las e admirá-las e só assim estaremos reparando uma partícula infinitesimal de todas as injustiças contra elas cometidas ao longo de toda nossa existência, e não só nos dias oito de março ou nos segundos domingos de maio, mas em todos os dias de todos os anos.
      Parabéns, mulheres-mães.